Tribunal do Júri -

Ex-militar acusado de matar filho de oficial de Justiça é condenado a 16 anos de prisão

Por Rômulo Rocha – Do Blog Bastidores

 

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UM TIRO CONTRA O VENTRE DA PRÓPRIA MÃE

- Juíza presidente do Conselho de Sentença, Maria Zilnar Coutinho Leal: “(...) os diversos disparos efetuados contra a vítima demonstram a intensidade do dolo com que agiu e a sua vontade incontida de ceifar a vida da vítima em local onde existia um aglomerado de pessoas (...)”

- Advogado de Acusação, Gilberto Ferreira: “Quando um soldado mata alguém da própria sociedade eu vejo como se o filho atirasse contra o ventre da própria mãe”

- Pai da vítima, oficial de justiça, o senhor Lopes: “[a perda de um filho] é uma coisa que não desejo para nenhum pai. Porque a pior desgraça que pode acontecer em cima de um ser humano é perder um filho. Mas eu estou satisfeito e é tocar o barco para frente”

“TODO MUNDO SABE COMO É A JUSTIÇA NO BRASIL”

- Do acusado, que empreendeu fuga por mais de um ano, ao ser inquerido pela juíza: “Eu vim para o júri por minha vontade. Estou aqui por minha vontade. Todo mundo sabe como é a justiça no Brasil, que é demorada”

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“MENOSPREZO PELA VIDA”, DIZ JUÍZA NA DOSIMETRIA DA PENA

Registro de um dos momentos do embate jurídico
Registro de um dos momentos do embate jurídico 

O ex-policial militar Igor Araújo, já condecorado por “bravura” pela Polícia Militar do Piauí, foi condenado pelo Tribunal Popular do Júri a 16 anos e 15 dias de reclusão em regime inicialmente fechado.  Ele é acusado de matar, com cinco tiros, o filho de um oficial de justiça do estado, o jovem Alan Lopes Rodrigues da Silva. O crime ocorreu em uma das comuns reuniões de jovens em postos de combustível, essa no da Avenida João XXIII, no final de fevereiro de 2016.

Igor Araújo foi condenado por homicídio qualificado, em face das qualificadoras motivo fútil e por não ter possibilitado defesa à vítima. Alan Silva foi alvejado “nas costas e pelas costas”, como enfatizou o advogado de acusação Gilberto Ferreira. A vítima estava consumindo bebida alcoólica dentro da loja de conveniência junto com um amigo – consumo cujo valor totalizou R$ 16,00 – quando iniciaram seus últimos minutos de vida.

Ali, já por volta das 4 da manhã, o acusado, acompanhado de um outro colega, Breno Ricardo de Carvalho Pereira, e ainda de Marcos Alves, filho do prefeito de Avelino Lopes, Diógenes Alves (PP), chegaram ao posto, tentaram adentrar à loja de conveniência, mas foram advertidos de que o recinto não mais se encontra aberto e que a dupla avistada lá dentro estava somente a terminar o consumo.

Foi quando o ex-policial, junto com Breno Pereira, segundo a acusação, teria tentado forçar a entrada, empurrando a porta de vidro, já fechada, e a pedir a Alan Silva que trouxesse bebida alcoólica para eles.

Funcionário da Agespisa, o jovem não atendeu o pedido, pagou a conta e tentou se retirar do recinto pela única porta que existia na loja de conveniência. Foi quando começou a ser empurrado por Breno, segundo os autos, e recebeu os disparos a queima roupa, advindo de uma pistola Taurus .40, que pertencia ao Estado, mas que estava sob a responsabilidade do então militar, para uso em serviço.

Em sua sentença, ao passar à dosimetria da pena, a juíza Maria Zilnar Coutinho Leal sustentou que “a culpabilidade do acusado é acentuada”. E que “o acusado, prevalecendo-se da condição de policial militar buscou um atendimento forçado em estabelecimento comercial”. Ainda, que “não atingindo o objetivo almejado, de forma impiedosa, efetuou diversos disparos de arma de fogo contra a vítima, quando a mesma acabava de sair do interior do estabelecimento no qual o acusado tentava adentrar”.

“Os diversos disparos efetuados contra a vítima demonstram a intensidade do dolo com que agiu e a sua vontade incontida de ceifar a vida da vítima em local onde existia um aglomerado de pessoas, assumindo o risco de também atingi-las com os disparos”, continuou, para acrescer à sentença que tal ato demonstra “o menosprezo pela vida e à integridade física dos seus semelhantes”.

Para o advogado assistente da promotoria, Gilberto Ferreira, o resultado do julgamento agradou a acusação como “representativa da sociedade” e em face da banalização da vida. “O crime que ele cometeu chocou a sociedade”, entendeu.

O advogado classificou a sentença como uma das “mais brilhantes” que ele já viu no Tribunal Popular do Júri em seu tempo de atuação. “Foi uma completa prestação jurisdicional”, avaliou.

O profissional do Direito também declarou que o Conselho de Sentença mandou um recado àqueles militares que se desvirtuam no caminho correto que deviam seguir.

Já as primeiras palavras do pai da vítima logo após a condenação, quando indagado se foi justa a condenação, foram de que “foi, foi”. Em meio aos cumprimentos de conhecidos, ele manteve o jeito simples e contido.

E tascou: “[a perda de um filho] é uma coisa que não desejo para nenhum pai. Porque a pior desgraça que pode acontecer em cima de um ser humano é perder um filho. Mas eu estou satisfeito e é tocar o barco para frente”.

O acusado, mesmo aos 23 anos, reponde ainda pelos crimes de tortura, contrabando e formação de quadrilha.

Na época do assassinato, ela faria a segurança de Marcos Alves, filho do prefeito de Avelino Lopes, e que não compareceu ao julgamento, mesmo arrolado como testemunha nos autos.

ENFRENTAMENTO

O ex-policial militar, que ficou foragido por mais de um ano, chegou a dizer à juíza durante o julgamento, em detrimento do Estado:

“Eu vim pro júri por minha vontade. Estou aqui por minha vontade. Todo mundo sabe como é a justiça no Brasil, que é demorada”.

Esqueceu-se o acusado, de que o júri iria ocorrer com ou sem a presença de Igor Araújo, já que ele empreendera fuga. Mas por aqueles destinos da vida ele fora preso acusado de receptar carga roubada em dezembro último. 

Ao advogado de acusação, Gilberto Ferreira, durante o seu interrogatório no mesmo julgamento, o acusado provocou:

“O senhor parece que não leu os autos”.

Experiente, o advogado somente sorriu e disse que aceitava os possíveis reparos.

O ex-militar deve iniciar sua pena na Penitenciária Irmão Guido.

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