CASO FUNACE -

Exclusivo: juíza relatora diz que Assis Carvalho “quebrou a confiança do cargo que ocupava”

 

Por Rômulo Rocha – De Brasília

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"O ATO TEM UMA LESIVIDADE SIGNIFICATIVA"

- Em atuação no TRF, 1ª Região, magistrada sustenta que Assis Carvalho quebrou a confiança necessária para a sua permanência no poder público

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“EMERGÊNCIA FABRICADA” PARA DISPENSAR LICITAÇÃO

Nas próximas sessões do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, a Corte judiciária vai julgar os recursos de apelação do deputado federal Assis Carvalho (PT), da então diretora administrativa da Secretaria de Saúde Jeanne Ribeiro de Sousa Nunes e da Fundação de Apoio à Cultura e Educação (FUNACE), em face de suspeitos contratos milionários referentes ao tempo em que o parlamentar petista esteve à frente da referida pasta e praticava a dispensa questionável de processos licitatórios.

No julgamento em curso, inciado em 7 de novembro, o voto da relatora do caso, a juíza convocada Rogéria Maria Castro Debelli, é contrário às intenções do deputado Assis Carvalho, assim como dos outros dois condenados, de verem reformada a decisão em primeira instância. A magistrada mantém o teor da sentença imposta pelo juiz singular Adonias Ribeiro de Carvalho de Neto. O caso está na Terceira Turma do TRF da 1ª Região e por enquanto está suspenso por conta de um pedido de vistas.

Debelli chega a ser dura em seu voto – cujo principal trecho segue transcrito e em áudio, logo abaixo – e afirma taxativamente que durante a gestão do deputado federal Assis Carvalho, enquanto secretário da Saúde, “houve quebra de confiança em relação ao cargo que ele ocupava e à instituição” e que “a confiança é necessária para a manutenção do vínculo” do agente com o poder público.

Ao acatar na íntegra o voto do juiz Adonias Neto, a juíza sustentou ainda que houve a tentativa de “criar hipóteses de dispensa de licitação que não restou contemplada em lei”.

“Ademais, caso o argumento do apelante Francisco fosse acolhido, no sentido de que tinha pouco tempo no cargo e não detinha pleno conhecimento dos fatos nessa época, tal argumento só poderia ser levado em consideração na primeira contratação. Não é o que se verifica em face das três prorrogações de contratos vultosos com uma empresa recém-criada [a FUNACE], não cabendo imputar culpa à Secretaria de Administração pela não realização da licitação”, sustentou a magistrada.

Os contratos supostamente irregulares celebrados entra a Secretaria de Saúde e a FUNACE correspondiam a R$ 2.686.993,83, dos quais R$ 360.093,60 seriam recursos do SUS.

Porém, conforme planilha levantada pela equipe de auditores do DENASUS, além desse valor, foi empenhado irregularmente o valor de R$ 517.088, totalizando, portanto, R$ 877.182,54 de verbas advindas do SUS para uma licitação com "emergência fabricada".

PERDA DOS DIREITOS POLÍTICOS

Em caso do voto da relatora ser mantido pelos demais pares da Terceira Turma, Assis Carvalho estará inelegível pelo prazo mínimo de cinco anos e terá que arcar com multa civil no valor de R$ 250 mil.

Já sua fiel escudeira Jeanne Ribeiro de Sousa Nunes, que hoje é empresária e atua no ramo de licitações públicas, ao lado de um dos advogados que a defende, a única condenação é a de multa civil no valor de R$ 100 mil.

Quanto à FUNACE, a condenação imposta é a de multa civil no valor de R$ 100 mil, além de proibição de contratar com o poder público ou receber incentivos fiscais ou creditícios pelo prazo de cinco anos.

PEDIDO DE VISTA

Na última sessão de julgamento, o desembargador Ney Bello pediu vistas do processo, uma vez que havia feito uma "confusão" com itens diferentes da pauta de julgamento daquele dia, como também é possível se extrair do áudio divulgado pelo 180, obtido pelo Blog Bastidores. O áudio foi solicitado e gentilmente cedido.

TRECHO DO VOTO SOBRE A "EMERGÊNCIA FABRICADA"

 

TRECHO TRANSCRITO DO VOTO DA RELATORA

(...) buscando criar hipóteses de dispensa de licitação que não restou contemplada em lei. Ademais, caso o argumento do apelante Francisco fosse acolhido, no sentido de que tinha pouco tempo no cargo e não detinha pleno conhecimento dos fatos nessa época, tal argumento só poderia ser levado em consideração na primeira contratação. Não é o que se verifica em face das três prorrogações de contratos vultosos com uma empresa recém-criada, não cabendo imputar culpa à Secretaria de Administração pela não realização da licitação. Concluo no sentido da existência do elemento subjetivo e da razoabilidade da sanções aplicadas (...) ao Francisco de Assis Carvalho. Suspensão de direito políticos pelo prazo de cinco anos, perda da função pública atualmente ocupada e multa civil no valor de R$ 250 mil. A Jeanne  deve ser condenada em multa civil no valor de R$ 100,00. Não é caso de aplicação da perda da função, suspensão dos direitos políticos e contratação com o poder público. Por fim, a Funace foi condenada na sanção de multa civil no valor de R$ 100 mil, proibição de contratar com o poder público ou receber incentivos fiscais, ou creditícios pelo prazo de cinco anos. E justifico a razoabilidade dessas sanções porque a multa civil tem um caráter punitivo que se soma ao ato condenatório com a finalidade de sancionar o agente que praticou o ato de improbidade. Na ação de improbidade administrativa, a multa tem como objetivo coibir atos atentatórios aos princípios da moralidade ou probidade, voltando-se a punir o agente, além de ostentar forma de intimidação com relação aos demais integrantes da sociedade. Faço citação doutrinária a esse respeito. E por entender também que o ato, ele tem uma lesividade significativa, a proposta de voto é no sentido da manutenção da perda da função pública em relação ao Francisco, porque houve uma quebra de confiança em relação ao cargo que ele ocupava e à instituição. (...) A confiança é necessária para manutenção do vínculo. Também a perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos só se efetivarão com o trânsito em julgado da sentença condenatória. E concluo que a sentença não merece reparo e, portanto, o voto é no sentido de negar provimento aos recursos de apelação (...).


SOBRE A DECISÃO DO JUIZ SINGULAR

NOTÓRIO TRECHO DO VOTO DO JUIZ ADONIAS NETO

"É dizer: se o gestor entende, em sua discricionariedade, que a legislação acerca de contratos e licitações é sobremaneira 'burocrática' ou lenta, a via de mudança não é uma interpretação enviesada da lei, mas, sim, sua eventual mudança por meio dos processos democráticos de alteração da Lei: no Parlamento", pontuou.

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