Caso de repercussão nacional -
A dura realidade: cães sofrem em condições precárias após serem apreendidos por prefeitura no Piauí
Imagine o dilema de ver seu companheiro de quatro patas, aquele que você cuidou desde os primeiros dias de vida, ser retirado à força de sua companhia e, semanas depois, descobrir que ele morreu em um abrigo. Este é o angustiante relato trazido por Kalina Silva, uma protetora de animais da cidade de Paulistana, no Sul do Piauí. O Portal 180graus, examinaremos todas as perspectivas e trás um olhar jurídico sobre o caso.
A história que reverberou entre protetores de todo o Brasil teve início em uma pequena cidade situada a 450 km de Teresina. Há cerca de quatro semanas, as Secretarias de Saúde, Vigilância Sanitária e Meio Ambiente de Paulistana responderam a uma denúncia de maus-tratos aos animais mantidos por Kalina Silva. Após obter uma autorização judicial, as autoridades realizaram à remoção dos animais de sua residência e levaram para um abrigo mantido pela prefeitura, onde receberiam os cuidados necessários. Toda a ação foi amplamente documentada e divulgada nas redes sociais do município.
No entanto, na mesma semana, imagens revelando as condições precárias do novo abrigo começaram a circular nas redes sociais. No início desta semana, Kalina visitou pessoalmente o local para conferir a situação dos animais, e o que ela encontrou foi desolador: alguns dos cães estavam mortos. Em um vídeo angustiante, a protetora expôs o estado em que se encontravam os animais e as instalações do abrigo.
A divulgação desse vídeo nas plataformas de mídia social captura a angústia de uma cuidadora desesperada, que testemunhou seus animais, agora subnutridos e doentes, confinados em espaços diminutos e submetidos a um ambiente insalubre. Tais condições estão claramente documentadas nas imagens divulgadas, que retratam um cenário de maus-tratos e negligência.
Embora o intuito inicial fosse proteger os animais de supostos maus-tratos, as circunstâncias atuais levantam sérias questões sobre a eficácia do abrigo oferecido pelo poder público. Como a protetora destacou, a situação não exige conhecimento técnico especializado para ser reconhecida como degradante e prejudicial à saúde dos animais.
Repercussão nacional
Não demorou muito para centenas de protetores estaduais e nacionais se pronunciarem, em seu perfil o Lar do Nando cobrou: "justiça pelos Os animais apreendidos da protetora Kalina e que estão sob tutela da Prefeitura de Paulistana PI .Os animais estão sendo negligenciados ,estão morrendo em local inadequado e insalubre".
Outros comentários:
O delegado Tales Gomes, gerente de Polícia Especializada da Polícia Civil do Piauí, informou que "foi feito um boletim de ocorrência. Recebi a informação que um veterinário fará um relatório técnico para poder definir o que fazer".
Convidamos Rony Torres, advogado e coordenador do Portal BrJus para analisar juridicamente o caso. "Não se faz aqui juízo técnico. Uma olhadela no vídeo feito pela cuidadora, que relata que foi impedida de visitar os cães se percebe a condição dos cães. A constatação dos maus-tratos infligidos aos animais não exige uma proficiência específica, sendo evidente a sua ocorrência. Se a prefeitura os recolheu sob a alegação de maus tratos, indaga-se: por que os animais continuam em situação danosa mesmo após recolhidos?", iniciou.
Prefeitura de Paulistana é torpe no tratamento dos animais e pensa que por convidar entidades está de acordo com a lei, veja a análise da nota emitida pela prefeitura feita por Rony Torres:
Em nota, a prefeitura alegou que “o prazo de 24h para recolher os cães foi curto”, que não possuía um canil para abrigar os cães e que o espaço onde os cachorros se encontram vem sendo reformado COM ELES LÁ DENTRO.
Beira o absurdo tal argumento.
Quanto a prefeitura gasta com assessoria jurídica? Quanto a prefeitura gasta com sua própria procuradoria? O Município não poderia recorrer da decisão? Preferiu receber os cães para colocá-los em situação evidentemente precária para “cumprir determinação legal”?
Não era só recorrer, pedindo mais prazo? Já que o “prazo era curto”.
O argumento de “prazo curto” sequer se sustenta, uma vez que a prefeitura disse ter tido tempo de solicitar médico veterinário, auxílio da Polícia Civil e de associação de proteção dos animais. Mas não tinha tempo de protocolar um recurso pedindo mais tempo para adequar o local para receber os animais?
Quem foi essa veterinária e Associação de proteção de animais que acompanham a situação desses cães? É bom investigarmos. A seguir veremos que a lei responsabiliza a todos pela proteção – não só a antiga cuidadora: como a nota da prefeitura deixa a entender.
A dita nota de esclarecimento, ainda alega que o “local vem passando por ataques” contra a estrutura física do ambiente onde ficam os animais – Quer dizer que o local não tem um segurança, cuidador ou veterinário em tempo integral? Nem para segurança do local e nem para segurança dos cães?
Ao fim da nota a prefeitura alega que recepcionará a OAB e ainda convida o Ministério Público e a secretaria de meio ambiente para darem “sugestões” sobre a “melhoria da estadia dos animais”.
NÃO...
Não é a OAB, não é o MP e nem a secretaria que deve dar “sugestões”. O período de “sugestões” seria ANTES DE RECEBER OS ANIMAIS. A OAB deve denunciar a situação no caso de presencia maus tratos. O MP deve abrir inquérito para apurar as condições sanitárias e de tratamento dos animais e processar a prefeitura na hipótese de constatação de maus tratos. E não “dar sugestões de melhoria”.
É risório o comentário de trancafiar um ser vivo em um ambiente insalubre para só depois preocupar-se em melhorar o ambiente.
Como a prefeitura fez questão de indicar artigos legais que salientam a conduta criminosa de maus tratos de animais, é importante indicar, também, que é dever do poder público garantir o bem-estar desses mesmos animais, e o prefeito e seus secretários são tão responsáveis pelo que vier a acontecer com eles quanto sua antiga cuidadora
Nota da prefeitura na integra:
O Piauí possuí lei que versa sobre casos como esses. E tanto a prefeitura quanto a cuidadora, caso comprovado qualquer situação de maus tratos, devem responder:
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Lei 7.752/2022
Art. 2º Considerando que os animais são seres sencientes, é vedado:
I - Ofender ou agredir fisicamente ou psicologicamente os animais, sujeitando-os a qualquer tipo de experiência, prática ou atividade capaz de causar-lhes sofrimento ou dano, bem como as que provoquem condições inaceitáveis de existência;
II -manter animais em local desprovido de asseio ou que lhes impeça a movimentação, o descanso ou os privem de ar e luminosidade;
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Não somente essa lei estadual, mas também a própria Constituição Federal obriga o poder público, através do art. 225, 1§ 1º, VII, no dever de cuidado com os cães, fato que não se verifica nos vídeos divulgados:
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Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.
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Não se pode adotar um argumento, hipócrita, de proteção ao mesmo tempo que se assume que não possuí um ambiente adequado para os cuidados. Em primeira vista, com base nos vídeos divulgados, parece que a prefeitura retirou os animais de uma “POSSÍVEL” situação de maus-tratos para colocá-los em uma situação “INCONTESTÁVEL” de maus tratos.
Não é necessário ser veterinário, ou sequer da área da saúde, para entender que um cachorro que já está há dias sob os cuidados do poder público e continua subnutrido ou que cachorros amontoados em celas com chão de terra, sem qualquer cuidado sanitário, configuram o propriamente dito: “maus-tratos”.
Não importa se é acompanhado por veterinário ou uma associação. Inclusive, como já dito anteriormente, é até bom que sejam, pois é interessante ver o posicionamento individual desses profissionais que deram o aval para a prefeitura colocar os cães naquele estado, pois a lei que se aplica para os cuidadores também se aplica para a prefeitura, seus administradores e profissionais contratados.
Encerramos essa primeira matéria citando a mesma lei que a prefeitura indicou em sua nota de esclarecimento, informando ser crime os maus tratos, mas agora jogamos luz no art. 2º:
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LEI Nº 9.605, DE 12 DE FEVEREIRO DE 1998
Art. 2º Quem, de qualquer forma, concorre para a prática dos crimes previstos nesta Lei, incide nas penas a estes cominadas, na medida da sua culpabilidade, bem como o diretor, o administrador, o membro de conselho e de órgão técnico, o auditor, o gerente, o preposto ou mandatário de pessoa jurídica, que, sabendo da conduta criminosa de outrem, deixar de impedir a sua prática, quando podia agir para evitá-la.
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Essa coluna se coloca à disposição da prefeitura, dos veterinários e da associação indicada na nota para maiores esclarecimentos, até lá os jornalistas e assessoria jurídica desse portal continuarão acompanhando o caso de perto.
Atualização:
Na última quarta-feira (16/08), após o fechamento desta matéria o abrigo recebeu a visita da Comissão de Proteção e Defesa dos Animais (CPDA) da OAB-PI. Na ocasião Foi apresentado ofício à Prefeitura com solicitações de melhorias para os animais, entre elas: água encanada, energia Elétrica, divisórias para separar animais pra evitar brigas, castração, vacinação, instalação de câmeras, apoio de ONG para cuidar dos animais diariamente, instalação de piso/cerâmica, comedouro e bebedouros, atendimento médico veterinário.
Segundo a CPDA: "das solicitações apresentadas, verificou-se que algumas já tinham sido providenciadas pela prefeitura, tais como: comedouros e bebedouros adequados; colocação de piso já está sendo realizada; instalação de 04 divisórias de telas e na área interna do prédio, tornando possível dividir os animais em 03 ambientes; atendimento médico veterinário; e apoio de ONG, que, no caso, está sendo feito pela Associação de Proteção Animal Salvando Vidas, inscrita no CNPJ nº 37.519.068/0001-91".
Muitos comentários deixados em publicações feitas nas redes sociais, alertaram que em nenhuma das imagens é possível ver os animais que foram levados para o abrigo, bem como registro de quantos morreram após a chegada no canil da prefeitura.