Efeitos do vírus no mundo -

Lugares inesquecíveis e o início da pandemia na Europa

Nasci em Brasília, onde passei minha infância e adolescência. Morei um tempo em Parnaíba e depois em Teresina, onde terminei o curso de filosofia na Universidade Federal do Piauí (UFPI). Fiz doutorado em Sociologia na Universidade de Brasília e me tornei professor da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), em Mossoró. Em 2019, consegui uma licença para realizar uma pesquisa de pós-doutorado na Universidade de Évora, em Portugal. O plano inicial era ficar em Portugal de dezembro de 2019 até junho de 2020. Vou contar aqui como foi a experiência de viver o antes e o durante a pandemia do coronavírus em Portugal.

Cheguei em Lisboa no início de dezembro de 2019. Logo em seguida iniciei minhas atividades de pesquisa na Universidade de Évora. Minha intenção era realizar um estudo comparativo sobre as políticas de diversidade cultural na educação no Brasil e em Portugal.

   Guilherme Paiva Carvalho

Évora é uma cidade linda, com muita história, localizada na região do Alentejo. Portugal se divide em regiões autônomas e o Alentejo fica situado no centro-sul do país. Em Évora há monumentos históricos como o Templo romano, a Sé Catedral, a Igreja de São Francisco, o Palácio de Dom Manuel e a Capela dos Ossos. Sempre movimentada com turísticas vindos da Europa e de várias regiões do mundo, na cidade se encontra a Universidade de Évora, uma das mais antigas da Europa, com colégios e faculdades espalhados pelo centro histórico e em vilas, como o Polo da Mitra em Valverde.

   Guilherme Paiva Carvalho

Além de atrações turísticas aos arredores da cidade, como o Cromeleque dos Almedres, no Alto de São Bento, que data do século IV antes de Cristo, ou a praia fluvial de Monsaraz e outros pontos turísticos, Évora fica bem próxima da Espanha. Praticamente 100 km de distância separam Évora de Badajoz, cidade localizada na região da Estremadura, na Espanha.

Comecei minha pesquisa em dezembro. Meu plano era visitar escolas da região do Alentejo em fevereiro e março. Minha família me acompanhou na viagem até o início de fevereiro de 2020. Aproveitamos as festas de fim de ano para conhecer a Espanha. Passamos por Mérida, Ronda, Sevilha e Zafra. No natal nos encontramos com amigos e amigas do Brasil em Lisboa. Depois fomos passar o ano novo em Mérida. Quando chegamos vimos a cidade toda enfeitada para as festas de fim de ano.

    Guilherme Paiva Carvalho

Os lugares que visitamos no final do ano em Portugal e na Espanha estavam movimentados, repletos de vida, com muitos turistas andando nas ruas. Alguns dias antes do ano novo, me lembro de ter visto uma reportagem na televisão em Mérida sobre casos de coronavírus em Wuhan, na China. Aquele problema de saúde parecia bem distante de onde estávamos. Mesmo com as notícias da epidemia na China durante o mês de janeiro, achei que seria algo parecido com outros surtos epidêmicos, como a gripe aviária (vírus Influenza). Na minha imaginação, o vírus seria contido na China.

O setor do turismo em Portugal e na Espanha, assim como em outros países da Europa, tem grande importância na economia. Com um movimento constante em bares, restaurantes, lojas, museus, centros históricos, pessoas vindas de várias regiões do mundo circulavam pelas cidades que visitamos. Em Lisboa, Évora, Mérida e Sevilha, fiquei impressionado com o tanto de gente caminhando nas ruas, sentados nos bares e restaurantes. Além de bares, lojas e restaurantes, o turismo movimenta o setor hoteleiro e o aluguel de imóveis por temporada por aplicativos, sem falar nas empresas aéreas. O aeroporto de Lisboa estava lotado quando chegamos. Gosto muito de assistir as notícias nas emissoras locais e lembro de uma reportagem que discutia a criação de um novo aeroporto de Lisboa. A matéria dizia que o atual aeroporto estava esgotado. Não imaginava que alguns meses depois ia ver aquele aeroporto praticamente vazio.

    Guilherme Paiva Carvalho

Depois das festas de fim de ano, continuei com as atividades do meu pós-doutorado na Universidade de Évora. Em janeiro, participei de um evento da Universidade na cidade de Idanha-a-Nova, uma linda vila do interior de Portugal, que fica no distrito de Castelo Branco. No início de fevereiro estive em Lisboa novamente para uma reunião com o grupo de estudo do supervisor do meu pós-doutorado na Universidade de Évora, o sociólogo José Resende. Aproveitei para acompanhar minha família até o aeroporto e me despedir. Com a família de volta para o Brasil, retornei sozinho para o trabalho em Évora.

Durante a semana, eu passava o dia trabalhando no Palácio do Vimioso, onde fica o Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais da Universidade de Évora. Da janela eu avistava um bar ao lado do Palácio onde estudantes se aglomeravam todos os dias da semana. O Templo romano fica bem próximo do Palácio e eu adorava tomar um cappuccino no pôr do sol em um quiosque que fica na frente do Templo, contemplando a vista e o movimento da cidade.

    Guilherme Paiva Carvalho

As noites de sexta e sábado eram movimentadas na cidade. Um dos primeiros bares que conheci em Évora foi o Molhó Bico. Nas sextas e nos sábados sempre tinha música ao vivo, às vezes com violão e voz, em outras ocasiões com grupos musicais com guitarra, baixo e bateria. É um bar dedicado ao rock com fotos de várias bandas, desde o Pink Floyd, Rolling Stones até o Queen, Jimi Hendrix, The Doors e Janis Joplin. Bem perto da minha casa ficava o Aqui Há Gato, outro bar intimista com cartazes antigos de publicidade do início do século XX.

Em fevereiro chegou a notícia sobre o primeiro caso de coronavírus na Itália. O vírus já havia saído da China. Ninguém tinha noção do que aconteceria dali em diante. Mesmo assim, apesar de ter chegado na Europa, fiquei pensando: — bom, a Itália está   distante daqui. Achei também que conseguiriam conter a propagação do vírus. Na verdade, não sabia do que se tratava. Talvez ninguém soubesse que seria tão devastadora a sua passagem por ali. Tanto é que o prefeito de Milão, naquele momento, chegou a compartilhar uma campanha com o slogan: “Milão não para”. Afinal, no final de fevereiro a Itália tinha pouco mais do que 500 casos e 14 mortes por causa do coronavírus. Continuei com minhas atividades de pesquisa, achando que aquele problema não chegaria onde eu estava.

    Guilherme Paiva Carvalho

 

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