Artigo -

Com quem preciso falar?

Por Moyses Barjud*

​Certa vez escutei de um crítico ao governo do Estado do Piauí que somente existiram grandes feitos na gestão de Alberto Silva. Tomei a liberdade de discordar de forma fundamentada, para não “futebolizar” o assunto. À parte os méritos e deméritos de Wellington Dias, que de um e de outro são vários, assim como Alberto Silva deixou um importante legado em obras estruturantes, a atual gestão petista conseguiu virar uma página negra da história do Piauí ao implantar o seu programa fundiário. Feito difícil, tanto que nos últimos 50 anos (desde o final da década de 70, para ser mais preciso) todos os governantes estaduais, incluindo os próprios Alberto Silva e Wellington Dias (em mandatos anteriores), tentaram e não lograram êxito: ou o programa era muito restrito e experimental, ou inaplicável.

​O atual regramento fundiário, composto por uma lei ordinária, uma lei complementar e uma emenda constitucional, mostrou a que veio ao, em menos de um ano, suplantar antigos imbróglios, como do Assentamento Santa Clara, em Canto Buriti, e da Serra do Quilombo, em Bom Jesus. Propositadamente escolhi um exemplo relacionado à agricultura familiar e outro ao agronegócio, mostrando que o programa não só é célere e eficiente (muitos produtores daqueles locais já estão com seus títulos e matrículas regularizadas nas mãos), como também é extensivo e inclusivo, amparando a todos, desde que tenha direito.

​Alcançar esse feito não foi fácil. Aliás, se fosse, Mão Santa teria conseguido, em vez de meter os pés pelas mãos e quase inviabilizar a produção na Serra do Quilombo. Tudo foi muito estudado e dialogado. Conversou-se - e de muitas reuniões participei como membro do Conselho Consultivo da Aprosoja e do Núcleo de Regularização Fundiária da Corregedoria Geral de Justiça do Piauí - com representantes da agricultura familiar, do agronegócio, da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional Piauí, do Governo do Estado por suas pastas Interpi, Secretarias de Fazenda, Agronegócio, Agricultura Familiar e Meio Ambiente, Tribunal de Justiça, Vara Agrária, Ministério Público, Deputados, Prefeitos, Vereadores, Associação de Advogados Agraristas e, principalmente, da Corregedoria Geral de Justiça, onde os estudos centralizaram-se e de onde partiram os projetos para aprovação na ALEPI. Até grileiros foram ouvidos com o propósito de saber o que eles não queriam que constasse nas leis para exatamente aquilo ser colocado.

​Maturado e implementado, o programa avançou de forma rápida. Com a segurança jurídica, novos investimentos estão chegando e, como eles, negócios, construções, obras, divisas, empregos e tudo o mais que permite enxergar o desenvolvimento com a mesma certeza com que enxergávamos Alberto Silva construindo a Transpiauí.

​A investida regularizatória enfrenta agora um de seus maiores e misteriosos desafios: a situação imobiliária do município de Baixa Grande do Ribeiro, aquele pequeno município de pouco mais de 10 mil habitantes que tem um dos maiores PIBs do Piauí. Apesar de quase toda a área do município estar inserida em uma matrícula pública estadual (matrícula 254 do Cartório de Ribeiro Gonçalves), o que a princípio facilitaria as coisas, têm surgido ali empecilhos ao prosseguimento dos levantamentos necessários para a identificação de limites e ocupantes, situação dominial individualizada e origem real.

​Mas como diria aquele amigo otimista: vai dar certo! Talvez o time envolvido na peleia ainda não tenha acertado a pessoa certa com quem falar. Já se tentou o Interpi, mas lá tudo gira de forma organizada, séria e eficiente. Não é lá o problema. Muito pelo contrário. De igual forma, o Tribunal de Justiça, a CGJ e a vice-CGJ. Todos uníssonos: a segurança jurídica é necessária e só se alcança nos exatos limites da legalidade, sem ideologias. É o que se busca, então também não é ali que está o problema. Falando com o Governador do Estado, de igual forma não se identifica ali a fonte dos empecilhos para as coisas avançarem e terem um desfecho em Baixa Grande do Ribeiro. Com quem precisam falar?

​Pensou-se em consultar a Comissão de Direito Registral e Notarial da OAB/PI no fito de ouvir uma opinião abalizada sobre onde se estaria errando na condução dos trabalhos regularizatórios da matrícula 254 naquele município (que engloba tanto a zona rural quanto urbana). Entretanto, refletindo sobre isso se chega à conclusão de que não é crível que uma lei tão discutida necessite de uma consultoria jurídica para ter o seu efetivo cumprimento.

​Se todas as cabeças estão em sintonia, estaria o problema em algum dos braços, alguma das abóboras que precisamos carregar? Aquele pequeno município de pouco mais de 10 mil habitantes merece permanecer entre os maiores PIBs do Piauí e auferir os louros que a segurança jurídica traz consigo. Os entes envolvidos na regularização fundiária estão – e permanecerão – mobilizados no sentido de encontrar o melhor caminho para que isso seja possível e, apesar de ainda se perguntarem com quem é preciso falar, no fundo sabem que as vezes é numa trombada que as abóboras se ajeitam.

*Moyses Barjud é ex-Presidente da Aprosoja/PI

Fonte: AsCom

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