Poder Judiciário -

Desembargador de SP diz que foi “vendido”. Investigações da PF assombram quatro TJs e até o STJ

Por Rômulo Rocha - Do Blog Bastidores

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- Investigações Brasil afora sobre venda de sentenças põem em xeque a credibilidade da Justiça brasileira, feita por pessoas, mas sob regramentos jurídicos rígidos

- Até o momento são noticiados casos envolvendo membros de quatro Tribunais de Justiça (SP, BA, CE e MS) e até supostas vendas de sentenças no Superior Tribunal de Justiça (STJ)

- Conselho Nacional de Justiça também determinou o afastamento de dois desembargadores em Mato Grosso

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Foto: Polícia Federal _Dinheiro apreendido pela Polícia Federal  em Operação no Mato Grosso do Sul
_Dinheiro apreendido pela Polícia Federal em Operação no Mato Grosso do Sul, a Ultima Ratio

SÃO PAULO

Ao Blog do Fausto Silva, do jornal O Estado de São Paulo, o desembargador Ivo de Almeida, do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-PI), negou qualquer venda de sentença, e disse ter sido "vendido" por terceiros. As declarações foram prestadas durante entrevista.

Segundo o magistrado, a PF teria como alvo quatro julgados, sendo que conforme as declarações dadas ao blog, em dois deles não haveria decisões de sua lavra. E os outros dois trataram de decisões colegiadas e referiam-se a casos “banais”.

A Operação Churrascada, que teve Ivo de Almeida como alvo, foi autorizada pelo ministro Og Fernandes, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ocasião em que a PF apreendeu R$ 160 mil em dinheiro vivo guardados em sacos. Parte do dinheiro foi encontrada em uma lavanderia. 

O magistrado foi indiciado última semana por corrupção passiva, lavagem de dinheiro, associação criminosa, advocacia administrativa e violação de sigilo funcional.

Na entrevista ao Blog do Fausto, o desembargador põe a culpa em um ex-amigo, falecido em 2019, que segundo Ivo de Almeida, achava que tinha influência no seu gabinete. 

Os advogados do membro do TJ também afirmam que ele não sabia de nada. 

Outras quatro pessoas também foram indiciadas no caso, sendo um advogado, suspeito de arrecadar propina de R$ 1 milhão para comprar decisão do desembargador. 

Ainda um traficante que seria beneficiado com habeas corpus, um guarda civil e um suposto emissário do desembargador nas negociações.

“O que posso dizer, objetivamente, é que jamais houve ‘venda’ de decisão judicial, assim como nunca proferi decisão ou pratiquei qualquer ato que pudesse envergonhar a Justiça, meus colegas de profissão, familiares e amigos”, afirma o magistrado. 

INVESTIGAÇÕES MÚLTIPLAS DE VENDAS DE SENTENÇAS

- Bahia

O Brasil hoje possui várias investigações da Polícia Federal e ou ações judiciais em curso que apuram vendas de decisões e sentenças em Tribunais de Justiça Brasil afora. 

Na Bahia, há os desdobramentos judiciais da Operação Faroeste, que apura venda de sentenças em disputas de terras no Oeste da Bahia.

Nesta semana a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) recebeu a denúncia do Ministério Público Federal (MPF) contra a desembargadora Sandra Inês Moraes Rusciolelli Azevedo, do TJ-BA, pelos crimes de organização criminosa, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. 

Além de receber a denúncia contra outras quatro pessoas, o colegiado manteve o afastamento da desembargadora até que seja concluído o julgamento da ação penal. Ela está afastada do cargo desde 2020, em razão de outros procedimentos derivados da Operação Faroeste.

Ainda segundo o STJ, tendo em vista a complexidade do esquema, o MPF dividiu a apuração em várias frentes, o que gerou denúncias distintas, algumas delas já recebidas pela Corte Especial e convertidas em ações penais.

De acordo com o MPF, a desembargadora e os outros réus teriam atuado em diferentes processos para atender aos interesses de uma empresa agropecuária, garantindo-lhe a propriedade de imóveis rurais. Em troca, os envolvidos receberiam cerca de R$ 4 milhões, dos quais teriam sido efetivamente pagos aproximadamente R$ 2,4 milhões.

A defesa da magistrada, por sua vez, alegou que as decisões proferidas por ela foram lícitas e que o patrimônio da família é compatível com as rendas legalmente declaradas. A defesa também sustentou não haver justa causa para a abertura da ação penal e apontou suposta nulidade de provas que embasaram a denúncia.

- Ceará

No Ceará, também essa semana, o advogado filho de um ex-desembargador foi preso sob suspeita de atuar em esquema de venda de liminares investigado pela Polícia Federal. As decisões visavam soltar presos que recorriam ao Tribunal de Justiça do Ceará. 

Condenado a 19 anos e 4 meses de prisão, além de uma multa de R$ 241 mil, o advogado Fernando Feitosa estava foragido desde a emissão de um mandado de prisão em 25 de outubro e foi localizado na casa de sua sogra.

Filho do desembargador aposentado Carlos Feitosa, Fernando foi investigado pela Operação Expresso 150, deflagrada em 2015, que revelou um esquema de venda de alvarás de soltura por valores que chegavam a R$ 150 mil.

As liberações ilegais ocorriam, segundo as autoridades, durante os plantões judiciais, geralmente nos fins de semana, com a intermediação do advogado por meio de um grupo no WhatsApp. 

No suposto esquema, Fernando Feitosa negociava habeas corpus e liminares que eram assinados pelo próprio pai, então desembargador.

Carlos Feitosa, afastado e aposentado compulsoriamente em 2019, também foi condenado a 13 anos e 5 meses de prisão pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) por crimes de corrupção e associação criminosa.

Em 2021, ele foi preso e, além das condenações por corrupção, foi sentenciado em outro processo a 3 anos e 10 meses de prisão por concussão, após extorquir parte dos salários de funcionárias de seu gabinete.

- Mato Grosso do Sul

No estado de Mato Grosso do Sul as vendas de sentenças envolveriam juízes e vários desembargadores do TJ-MS. Há menos de um mês a Polícia Federal deflagrou a Operação Ultima Ratio.

Ao todo cinco desembargadores do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul estão afastados de suas funções e fazem uso de tornozeleira eletrônica. E o caso pode ser maior. 

Não só os magistrados, mas servidores do judiciário, advogados (sendo alguns filhos de desembargadores), empresários e até um procurador de Justiça são investigados por lavagem de dinheiro, extorsão, falsificação e organização criminosa.

Durante a operação, armas foram encontradas na casa de dois desembargadores, sendo apreendidas cerca de 40 ao todo, além de também terem sido apreendidos cerca de R$ 4 milhões em dinheiro vivo. 

A polícia também apreendeu documentos, celulares, computadores, bem como mídias e anotações que serão periciados.

A operação deflagrada é um trabalho de três anos de investigação da Polícia Federal e ganhou o nome de Ultima Ratio vez que é um princípio do Direito no qual a Justiça é tida como o último recurso para barrar os criminosos, quando nada mais pode ser feito.

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Nem o Superior Tribunal de Justiça (STJ) escapou das investidas da Polícia Federal diante da suspeita de vendas de sentenças que ocorreriam na Corte.

Segundo reportagem da Revista Veja, há informações de que vendas de sentenças teriam ocorrido nos gabinetes dos ministros Og Fernandes, Isabel Gallotti, Nancy Andrighi e Paulo Dias Moura. Não há, no entanto, informações concretas de que os ministros estejam envolvidos. 

O caso, entretanto, foi parar no Supremo Tribunal Federal (STF), porque segundo a Constituição, ministros do STJ são investigados e julgados pelo STF.

O relator do caso na Corte constitucional é o ministro Cristiano Zanin, ex-advogado do presidente Lula e indicado como ministro do Supremo pelo petista. 

O caso tramita sob sigilo.

CNJ DETERMINA AFASTAMENTO DE DESEMBARGADORES EM MT

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinou, em 1º de agosto deste ano, o afastamento de dois desembargadores do Tribunal de Justiça de Mato Grosso por suspeitas de envolvimento em venda de sentenças, devido a estreitas ligações com o advogado Roberto Zampieri, assassinado em dezembro do ano passado.

A investigação da morte do advogado tramita na 12ª Vara Criminal da capital Cuiabá e, segundo o Ministério Público Estadual, pode ter relação com decisões proferidas pela Justiça de Mato Grosso.

O conteúdo do celular do advogado, de posse da Polícia Civil, revelou situações comprometedoras. Há suspeitas de que os magistrados favoreciam os interesses do advogado em prejuízo a terceiros. Daí o suposto motivo do assassinato.

O Corregedor Nacional, ministro Luis Felipe Salomão, também determinou uma investigação sobre reclamações disciplinares contra os dois membros do TJ de MT.

E determinou a quebra de sigilos bancários e fiscal dos investigados e de servidores do tribunal estadual referentes aos últimos cinco anos.

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