Habitualidade -

A incrível história do prefeito Joãozinho Félix nos labirintos da Justiça em meio a muitas suspeitas

Por Rômulo Rocha - Do Blog Bastidores

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- Do suposto uso de comissionados advogados em prol de sua reeleição, passando por pagamento a fundo do MP-PI para se livrar de processo, à acusação de mando para assassinar jornalista no Piauí

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Foto: Divulgação / Rede Social _Prefeito Joãozinho Félix
_Prefeito Joãozinho Félix

A JUSTIÇA E O JOÃOZINHO

Era uma vez, num lugar não tão distante, um prefeito chamado Joãozinho Félix, de Campo Maior, que novamente está envolto em polêmicas junto à Justiça, sendo agora tanto no âmbito criminal, como no eleitoral. Não são fatos isolados. O político, ao longo da sua vida, já teve embates apoteóticos, como no caso dos prefeitos itinerantes, e mais recentemente, no âmbito de uma ação por improbidade administrativa, que se arrastou na Justiça por anos, e houve perda de prazo em um recurso para o Tribunal de Justiça do Piauí, mas Félix acabou conseguindo dar cabo do processo, saindo-se vitorioso, ao fazer acordo em que repassaria dinheiro a Fundo do MP-PI. Félix, entre outros, também é acusado de mandar matar um jornalista, o que ele nega.

Uso Indevido do Programa Bolsa Social

Nos processos mais recentes, um diz respeito ao suposto uso eleitoral do programa Bolsa Social, instituído pela prefeitura de Campo Maior. O Ministério Público Eleitoral viu uso ilegal do programa ao avaliar informações constantes de Ação Judicial Eleitoral (AIJE) ajuizada pela Federação PSOL/Rede de Campo Maior do Piauí em face do prefeito e então candidato à reeleição Joãozinho Félix, do candidato a vice-prefeito Sebastião de Sena Rosa Neto, do secretário municipal de Assistência Social Joares Oliveira Cavalcante Júnior e da Coligação O Trabalho Continua (PP, Republicanos, PDT).

Segundo a inicial da ação, o político e seu grupo foram beneficiados com a concessão ilegal de benefícios assistenciais (Bolsa Social), com majoração de beneficiários (inclusive vários do município de Jatobá do Piauí) e de valores, violando, assim, normas destinadas a manter o equilíbrio e a igualdade de forças durante o certame eleitoral.

Para o MPE, houve “violação do disposto no art. 37, da CF (mais especificamente, afrontou a legalidade, moralidade e eficiência) e no art. 73, IV, da Lei das Eleições”.

A defesa nega irregularidades. 

O promotor de Justiça Eleitoral Ricardo Lúcio Freire Trigueiro destacou que “de início, lendo e relendo a vasta documentação anexada aos autos, dando conta de uma imensidade de pessoas beneficiadas por programa social, percebe-se a ausência de algo bastante fundamental nesta seara (qual seara?? A seara da concessão de benefícios assistenciais por parte de órgão da administração pública e que, naturalmente, visam atender as necessidades de determinadas camadas sociais)”.

“Tudo isso exige uma espécie normativa que, naturalmente, inova o ordenamento jurídico, traçando o desenho institucional do referido benefício, criando-o, regulamentando a sua percepção e seus beneficiários, estabelecendo a fonte de receita e outros. No presente caso, antes mesmo de saber se houve ou não aumento do nº de beneficiários, se houve ou não o aumento do valor dos benefícios, se houve ou não beneficiamento de pessoas residentes no Município de Jatobá do Piauí (local onde o filho do Investigado João Félix foi candidato), deve ser verificado se há lei que escora juridicamente este benefício”, acresceu.

“Compulsando os autos, verifica-se a existência de Projetos de Lei, cuja natureza, e aqui se aprende tais noções ainda nos primeiros anos da faculdade de Direito, difere rigorosamente da lei já perfeita e acabada. É dizer, projeto de lei não inova o ordenamento jurídico ordinário, assim como a PEC não tem capacidade de alterar a Constituição”, argumenta.

Segue afirmando que “para além deste vício, que na visão do MP é o mais grave, verifica-se a existência de diversos outros vícios decorrentes. É dizer, não poderia a administração pública municipal aumentar a quantidade de beneficiários de um programa social carecedor de lei que o institua. Independentemente de haver ou não espaço orçamentário para tanto. De igual forma, não poderia a administração municipal majorar o valor de um benefício assistencial carente de lei que o fundamente. Por fim, não poderia o Município de Campo Maior beneficiar pessoas de outra municipalidade, não qualquer municipalidade, mas aquela em que o filho do investigado João Félix é candidato”.

O caso está na Justiça Eleitoral.

Uso de Advogados comissionados da prefeitura na eleição

Também tramita na Justiça Eleitoral caso em que Joãozinho Félix é acusado, e já chegou a ser condenado em primeira instância, pelo suposto uso de advogados comissionados da prefeitura de Campo Maior para trabalhar no último pleito eleitoral, quando logrou êxito em sua campanha à reeleição.

O prefeito de Campo Maior Joãozinho Félix foi condenado pela Justiça Eleitoral junto com seu vice Sebastião de Sena Rosa Neto por uso indevido de servidores públicos nas eleições municipais de 2024, uma conduta vedada no período eleitoral, segundo a Lei das Eleições.

Cada um dos requeridos terão que pagar 60 mil UFIRs - o que equivaleria a cerca de R$ 284 mil se calculado com atualização, vez que extinta no âmbito federal em 2000, quando valia R$ 1,06, tendo o Piauí sua própria unidade fiscal, próximo de R$ 5,00.

Neste caso, Félix teria produzido provas contra si mesmo.

O caso trata da atuação de 4 servidores municipais comissionados, advogados, que teriam usado o horário de expediente para trabalhar em prol da campanha de reeleição do então candidato, peticionando (e, portanto, deixando registros), quando deveriam estar realizando atividades no respectivo órgão público, contribuindo assim com os afazeres da máquina administrativa e em prol dos governados.

“Logrou a requerente [Coligação a Força do Povo] demonstrar que os servidores apontados protocolaram petição eletrônica, isto é, ato privativo de advogado, durante o horário do seu expediente, ou seja, entre 07h30min e 13h30min”, traz a sentença.

“Além disso", continua a sentença judicial, "percebeu-se uma curiosa circunstância temporal atinente ao pagamento pelos serviços advocatícios privados dos quatro servidores. A respectiva nota fiscal somente foi emitida após a citação dos réus no presente processo, isto é, em 27/09/2024, embora o instrumento contratual tenha sido supostamente firmado em 20/07/2024”.

“Como se não bastasse, o valor do contrato, considerando-se a contratação de 04 (quatro) advogados para a prestação de assessoramento jurídico pleno durante toda a campanha eleitoral, está consideravelmente abaixo da tabela de honorários da OAB ou do valor corrente de mercado”, acresce.

“Ante esse quadro, exsurge clara a intenção de conferir a posteriori traços de legalidade ao negócio jurídico sob enfoque, situação a indicar fortemente a existência de simulação e a tentativa frustrada de encobrir um ato manifestamente espúrio”, conclui.

"Por fim, tratando-se, consoante anteriormente registrado e nos termos da legislação de regência, de condutas configuradoras de atos de improbidade administrativa, inclusive no que tange à participação dos comissionados/advogados, as respectivas consequências no âmbito civil devem ser apuradas na seara processual pertinente, razão para determinar o envio dos autos ao representante do Ministério Público com a correspondente atribuição", pontua.

A determinação para envio dos autos ao Ministério Público é “independentemente do trânsito em julgado".

A defesa nega irregularidades.

Acusação de ser o mandante da morte de irmão de jornalista e a ordem para assassinar profissional de imprensa

Recentemente o Tribunal de Justiça do Piauí retirou da pauta, já pela terceira vez, um Recurso em Sentido Estrito (RESE), de autoria de Félix, para dar cabo de uma sentença de pronúncia que o remete ao Tribunal do Júri Popular pela suposta prática de ser mandante do assassinato de irmão de jornalista.

A juíza Daiane de Fátima Soares Fontan Brandão, da 1ª Vara da Comarca de Campo Maior, pronunciou no final do ano passado o prefeito de Campo Maior pelo crime de homicídio qualificado -  mediante paga ou promessa de recompensa, ou motivo torpe, recurso que impossibilitou a defesa da vítima, tipificados no art. 121, § 2°, I e IV do Código Penal - cometido contra Alípio Ribeiro Santos, determinando que fosse o político submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri da comarca.

Também foram pronunciados Francisco Teixeira Dantas, Francisco Teixeira Dantas Júnior, João Batista da Silva Reis e Rosa Maria Silva Freitas, todos em face da mesma tipificação penal.

A acusação sustenta que João Félix de Andrade Filho, em razão da sua condição de político e prefeito no ano de 2009, passou a hostilizar Arnaldo Ribeiro dos Santos por sua atividade como radialista e jornalista em Campo Maior.

O comunicador realizava críticas em relação ao político na época que antecedeu o crime do irmão. 

Ainda segundo a peça acusatória, em “razão de ser inimigo de Arnaldo Ribeiro dos Santos, por volta do mês de junho de 2009, o denunciado João Felix de Andrade Filho procurou a denunciada Rosa Maria Silva Freitas e solicitou que esta contratasse alguém para matar a vítima Alípio Ribeiro dos Santos em razão do motivo torpe por ser irmão do jornalista Arnaldo Ribeiro dos Santos para que a morte da vítima atingisse o jornalista, bem como a morte de Arnaldo Ribeiro dos Santos”.

A peça acusatória sustenta que foi então que Rosa Maria Silva Freitas entrou em contato com Marcos Gago, que vem a ser o Marcos Aurélio Pereira Araújo, e o contratou pelo valor de R$ 150.000,00 para matar Alípio Ribeiro dos Santos e Arnaldo Ribeiro dos Santos.

Félix nega ser mentor intelectual do caso.

Pagamento a Fundo do Ministério Público, em ANPC, para se livrar de ação incômoda

Início desse ano a desembargadora Lucicleide Belo, do Tribunal de Justiça do Piauí (TJ-PI), homologou o Acordo de Não Persecução Cível (ANPC) em que o prefeito de Campo Maior Joãozinho Félix pagará valores ao Fundo da Infância e Juventude do município de Campo Maior e ao Fundo de Modernização do Ministério Público do Estado do Piauí e com isso manterá seus direitos políticos intactos, sem risco de ver questionado seu atual mandato. 

Félix havia sido condenado por improbidade administrativa em primeira instância e perdeu o prazo para recorrer da sentença condenatória, levando o próprio TJ-PI a entender que houve o trânsito em julgado do caso. 

Mas o político e seus advogados em uma correria que demorou longo tempo, em meio a sucessivos recursos, procuravam uma saída honrosa junto à Justiça estadual, só que para isso precisariam contar com a ajuda do Ministério Público Estadual. 

A procuradora de Justiça que atuava no caso, Teresinha de Jesus Marques, da 12ª Procuradoria de Justiça - o Ministério Público, aparentemente era um empecilho para que fosse formulado um ANPC, vez que já havia se posicionado duramente contra Félix devido aos inúmeros recursos protelatórios que pareciam não levar a lugar algum, mas que impediam a execução da sentença condenatória.

Foi justamente esses intermináveis recursos apresentados pelo gestor para manter os direitos políticos que levaram a procuradora de Justiça a sustentar que o prefeito de Campo Maior, Joãozinho Félix, “brinca com a Justiça” do Piauí. 

Não adiantaria a dura afirmação. 

Isso porque a procuradora de Justiça Raquel de Nazaré Pinto Costa Normando, respondendo pela 12ª Procuradoria de Justiça, acabou por formular acordo com o político e o remeteu à relatora do caso no TJ, a desembargadora Lucicleide Belo.

Por esse acordo, que viria a ser homologado, o prefeito de Campo Maior compromete-se a pagar o valor de R$ 349.521,85, dividido em 18 parcelas de R$ 19.417,88, e que deverá ser repassado mensalmente, sendo metade (R$ 9.708,94) para o Fundo da Infância e Juventude do Município de Campo Maior e metade (R$ 9.708,94) para o Fundo de Modernização do próprio Ministério Público.

Negócio de ouro. 

Prefeito Itinerante

No passado, Félix já demonstrava ser bom de briga, apesar de algumas barberagens. 

Afastado do cargo de prefeito de Campo Maior (PI) pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do estado do Piauí, Joãozinho Félix ajuizou Ação Cautelar (AC 2820) no Supremo Tribunal Federal (STF). Considerado “prefeito itinerante” pela Justiça Eleitoral, ele pretendia ser reconduzido a seu cargo até o julgamento final de um recurso extraordinário ajuizado na Corte por seus advogados para discutir a matéria.

João Felix havia sido declarado inelegível pelo TRE com base no artigo 14, parágrafo 5º, da Constituição Federal de 1988. Isso porque ele foi prefeito de Jatobá do Piauí entre 1997 e 2003 (dois mandatos consecutivos), e depois prefeito de Campo Maior entre 2005 e 2008. De acordo com a corte estadual, a eleição de João Félix, em 2008, caracterizaria um quarto mandato. O Tribunal Superior Eleitoral confirmou a decisão do TRE, e considerou que ao caso se aplicaria a tese do “prefeito itinerante”.

De acordo com os advogados da época, João Felix exerceu o mandato de prefeito de Jatobá do Piauí até 2003, quando renunciou ao cargo e se desincompatibilizou a tempo para concorrer ao novo pleito. Quando concorreu ao cargo de prefeito de Campo Maior, em 2004, ele já tinha mudado inclusive seu domicílio, sustentavam.

Assim, para o pleito de 2008, não ocorreu transferência de domicílio eleitoral. Portanto, não haveria que se falar em fraude na transferência do domicílio eleitoral, fundamento cerne utilizado pelo TSE para a fixação da tese do prefeito itinerante. Isso porque “a tese firmada pelo TSE encontra-se umbilicalmente ligada à transferência de domicílio, que consubstanciaria fraude à Constituição Federal”.

“Tem-se, na hipótese, pois, não o exercício de quarto mandato como alardeado, mas o exercício de segundo mandato, na localidade de Campo Maior (PI), após regular eleição no pleito de 2004”, concluíram os advogados. Eles pediam a recondução de João Felix ao cargo de prefeito de Campo Maior até o julgamento final do RE pelo Supremo Tribunal Federal.

O então ministro César Peluso, do STF, em decisão monocrática, acabaria por determinar a volta de João Félix à prefeitura de Campo Maior. 

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