Operação Iscariotes -
Empresário disse à PF que promotor de Justiça "queria ser amigo" e fazer blindagem ao pedir R$ 3 mi
Por Rômulo Rocha - Do Blog Bastidores
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- Deflagração da Operação Iscariotes levou só cerca de 12 dias na parceria PGJ e PF
- Veja trechos exclusivos das declarações do empresário à Polícia Federal
- No dia 1º de agosto, ao ir na casa do promotor, empresário foi revistado
- Dia 2 de agosto ele voltaria, já com equipamento que captava áudio e vídeo
- Dia 7 de agosto foi deflagrada operação contra o promotor de Justiça
- Caso começou com a abordagem do promotor no dia 26 de julho em Barra Grande
- Junno diz que membro do MP-PI falou em juiz, desembargador e ministro
- Mas ao não citar nomes, acha que promotor de Justiça agiu sozinho na "extorsão"
- Empresário disse que ficou "chocado", "assustado", "intimidado", "amedrontado"
- Disse que pensou em ceder às investidas do promotor para entregar os valores
- Esposa de Junno foi quem teria aconselhado empresário a procurar a PF
- Esposa do promotor teria pedido de volta dinheiro pago à VM Experience por passeio
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O "AMIGO" DAS ONÇAS
No dia 1º de agosto, em encontro do empresário Junno Pinheiro com o promotor de Justiça Maurício Verdejo que antecedeu a primeira entrega de dinheiro quando foram captados diálogos (2 de agosto) e que antecedeu a segunda entrega de dinheiro quando também foram captados diálogos (7 de agosto), ambos se reuniram na residência do membro do Ministério Público no Alphaville, segundo relatos repassados à Polícia Federal em um dos termos de declarações prestadas pelo denunciante, no caso Junno.
Segundo o empresário, ao entrar na casa do promotor, Verdejo pediu para revistá-lo. Vindo a apalpar os bolsos dianteiros e traseiros do empresário, sua cintura, sua parte genital, suas pernas, suas costas e pediu para levantar sua camisa. Segundo relatos de Pinheiro, o promotor estava preocupado que a conversa pudesse ser gravada.
Nesse encontro ainda não havia equipamento de gravação de áudio e vídeo de posse de Junno, que foi cedido pela PF nos dois encontros posteriores quando da entrega de valores, ocorridos nos dias 2 e 7 de agosto - esta última, data da deflagração da Operação Iscariotes.
Ainda segundo os relatos do empresário repassados à PF, em termo de depoimento, Verdejo teria dito que no encontro inicial entre ambos em Barra Grande, litoral do Piauí, encontro esse que antecedeu todos os ocorridos em agosto, o promotor de Justiça teria afirmado que encontrou Junno “por acaso, o reconhecendo após ouvir alguém lhe chamar pelo nome”.
“Caixa Preta” no GAECO
Na casa do promotor, já dia 1º de agosto, também teria dito o promotor, na versão repassada pelo empresário em depoimento à PF, que ele iria ao GAECO (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) para pedir o arquivamento do PIC com fundamento na decisão do Habeas Corpus, que foi impetrado pelo advogado William Guimarães em favor de Junno, que acabou fazendo com que o Tribunal de Justiça do Piauí, a princípio, suspendesse uma investigação contra o empresário e suas empresas no âmbito da Operação Jet Ski.
Essa operação tinha sido deflagrada com apoio do GAECO, após o promotor realizar, através da 6ª Promotoria de Justiça de Picos, o que seria a investigação inicial.
Também foi repassado à Polícia Federal nesse depoimento de Junno Pinheiro, que Maurício Verdejo teria dito que possuiria “no GAECO uma caixa preta com vários documentos do sigilo bancário quebrado na Operação JET SKI e que iria pegar todos esses documentos e levar para o seu gabinete em PICOS”.
Isso porque “desta forma não teria risco de outro promotor [de Justiça] pegar essa documentação e fazer qualquer investigação ou denúncia contra sua pessoa”.
Ainda, que Maurício Verdejo teria prometido, “após o acerto ", que "também iria fazer sua “blindagem, passando a trabalhar para defendê-lo em futuros processos que pudessem existir”.
Exigência do pagamento em casa
Além disso, tudo conforme a versão de Junno no depoimento à PF, Verdejo “exigiu” que o pagamento fosse realizado em sua casa, “uma vez que tinha medo de receber dinheiro em local público”.
Que Maurício Verdejo teria dito que até poderia receber o dinheiro em local público “porém, neste caso, não iria pessoalmente, mas mandaria um representante para receber”.
A primeira entrega estava pré-estabelecida para o dia 2 de agosto - data limite. Verdejo, segundo Junno, teria cobrado R$ 3 milhões. Depois reduziu para R$ 2 milhões. Sendo R$ 1 milhão dia 2 de agosto e a outra parte, mais R$ 1 milhão, para quando a investigação fosse de fato arquivada. No dia 2 de agosto Junno entregou só R$ 500 mil e ficou acordado para a semana seguinte os outros R$ 500 mil, vindo a ser realizada a entrega dia 7 de agosto, quando a Polícia Federal, que monitorava o caso, realizou a Operação Iscariotes.
A origem de tudo
As primeiras declarações à PF
Exigência no Mô Restaurante, em Barra Grande
As declarações iniciais de Junno Pinheiro que deflagraram o caso foram prestadas perante o delegado da Polícia Federal Carlos Alberto Ferreira do Nascimento, em Parnaíba (depois o caso seria conduzido por outro delegado, dessa vez, por Ronildo Rebelo Lages da Silveira).
Segundo o narrado naquele momento do caso, o empresário sustentou que o promotor de Justiça Maurício Verdejo, no dia 26 de julho (uma sexta-feira), o abordou, por volta das 21h, ocasião em que se encontrava no restaurante Mô Barra Grande, e ali exigiu dinheiro sob o pretexto de “facilitar a vida do empresário” no bojo de uma investigação criminal que envolvia contratos com o governo do estado.
Ainda segundo Junno, neste depoimento, o promotor de Justiça Maurício Verdejo teria declinado interesse em um outro processo, “relacionado a um acidente de trânsito”.
Ocasião em que teria feito “referência deselegante ao promotor que atua naquele segundo caso, classificando este outro membro do MP-PI de “muito complicado… difícil”. Mas que ele, Verdejo, teria “como ajudar”, caso Junno Pinheiro colaborasse.
“Queria ser amigo”
Verdejo teria então perguntado se Junno estava com aparelho celular. Junno diz que não. E em meio a esse diálogo o membro do MP-PI teria dito que “precisavam ter uma conversa definitiva sobre a situação do processo”, exigindo R$ 3 milhões, para que Junno tivesse “paz”, e que o processo investigatório “teria outro rumo” a partir do acerto, e que “queria ser amigo”, caso contrário, a vida do empresário só “iria piorar”, obrigando o promotor a “trabalhar mais para o denunciar no processo”, que tinha “muita força no Tribunal de Justiça do Piauí e junto aos tribunais de Brasília”.
Segundo relatório de informação da Polícia Federal, Maurício Verdejo é natural de Goiânia (GO).
Ainda segundo Junno, quando dos repasses de informações à Polícia Federal em Parnaíba, o promotor de Justiça teria repassado seu telefone para se comunicar "só e somente com ele".
Também segundo Junno, presenciaram a abordagem, só que a distância - o que impediu de ouvir o que estava sendo dito pelo promotor, “todas as pessoas que estavam na expedição”. Sua esposa Denyse e alguns amigos: Érico, Valessa, Fernando, Valber, dentre outros funcionários e amigos. E que um desses amigos, Valber, foi quem anotou o número de telefone do promotor, já que seu celular (de Junno) estava descarregado.
Eventuais recursos iriam parar em juízes ligados ao promotor
Nesse encontro, no Mô Restaurante, em Barra Grande, também segundo o que narrou Junno Pinheiro à Polícia Federal em julho, em Parnaíba, o promotor de Justiça teria dito que qualquer recurso que o empresário movesse, “iriam parar” em juiz ou desembargador “ligado a ele” promotor.
E ao dizer isso, em tom de ameaça, teria complementado: “melhor resolver logo comigo até a próxima sexta-feira”, que seria o dia 2 de agosto, caso contrário “a sua situação não terminará bem”.
Teria chegado a afirmar para Junno, na visão deste, em tom intimidatório, que estava no litoral piauiense hospedado na casa de pessoa a que se referia como “ministro”.
Na ocasião do seu depoimento em Parnaíba, Junno disse que o promotor de Justiça não declinou nenhum nome de magistrado ou outra autoridade “a quem se referia insistentemente”.
Junno disse que tentou argumentar, indagando ao promotor de Justiça sobre “o que existia de fato contra mim”, “o que havia feito para merecer essa perseguição”, “que os advogados estavam informando tudo na Justiça e o processo estava suspenso por ordem do TJ”.
Ocasião em que o promotor de Justiça teria dito que “a suspensão nada valia” e que “se não resolvesse iria continuar” e que “somente piorou as coisas com o habeas corpus” impetrado por Junno para trancar a investigação.
Após isso o promotor de Justiça teria exigido de Junno que o procurasse dentro do prazo estipulado para “resolver” a situação diretamente com ele, sem comunicar ou procurar qualquer advogado ou outra pessoa.
Em continuidade, o empresário, sentindo-se constrangido com a situação, chegou a checar com terceiros “discretamente”, vez que atua na área de turismo no litoral do Piauí, sobre a presença de eventual desembargador ou ministro no litoral, mas que seus contatos não relataram nenhuma presença de “autoridades judiciais” no litoral, “o que o leva a crer que seja uma ação de extorsão isolada do promotor, usando de um prestígio que de fato não existe”.
Em "choque"
Junno Pinheiro chegou a dizer que ficou “chocado” com o fato e procurou informações sobre o promotor de Justiça para saber se era ele mesmo. Embora já tivesse participado de audiência virtual com a autoridade, naquele momento após o ocorrido, “não foi capaz de saber se tratava com a mesma pessoa”, ainda que o membro do MP-PI tivesse se apresentado informando sua função e cargo.
Que “fez essa busca [“em portais de comunicação”] por ainda está chocado pelo fato de que um promotor tivesse aquela conduta extorsiva e ousada de ir presencialmente pedir dinheiro”.
Junno disse que “nunca prometeu ou sinalizou em fazer qualquer pagamento a qualquer autoridade”, que sequer possuía o montante em espécie.
O empresário disse ainda que o promotor de Justiça estava acompanhado de mais duas pessoas desconhecidas para ele, uma mulher e um homem. E que permaneceram sentados em mesa próxima à mesa ocupada por Junno, familiares e funcionários que participavam de expedição com “amigos e representantes atuantes na área médica”.
Afirmou que confirmou o número do promotor através de mensagem enviada para Maurício Verdejo sobre outro evento da VM Experience e que o promotor afirmou que estaria em Teresina, na quinta-feira seguinte pela manhã, “sugerindo que aguardaria um posicionamento antes de seguir para Picos e retomar o processo”.
Nessa ponto do depoimento prestado por Junno na Polícia Federal, ele é indagado sobre os motivos do Habeas Corpus que ocasionaram a suspensão da investigação de autoria do promotor contra sua pessoa, e Junno afirmou que achou estranha a insistência do promotor quando, após audiência com a dita autoridade, apresentou todos os documentos e informações via advogado Willian Guimarães, e mesmo assim houve insistência na investigação, representando por diversas cautelares e comparecendo pessoalmente a sua casa para realizar as buscas e apreensões.
A Operação Jet Ski, a que Junno faz referência, foi deflagrada em parceria com o GAECO e outros atores em 26 de abril de 2024 e investigava supostas irregularidades em contratos de locação de equipamentos hospitalares feitos supostamente sem licitação com a extinta Fundação Estadual de Serviços Hospitalares (FEPISERH.
Junno acresceu no depoimento à PF, em julho, que nessa mesma cautelar, apesar do objeto investigado ser serviços da área de saúde, foram incluídas todas as empresas pertencentes ao empresário, tanto na área náutica, turismo e até um restaurante e ainda denominou a Operação de Jet Ski, em prejuízo à imagem da empresa náutica.
Também disse que a esposa do promotor, na condição de “consumidora/contratante” de serviços náuticos prestados por sua empresa VM Experience, chegou a pleitear, através de reclamação, devolução do valor de passeio sem razões justas, vez que o serviço foi prestado.
Em suas declarações iniciais à Polícia Federal, informou que não sabia mais o que fazer ou a quem recorrer, que se via sem saída caso as autoridades não tomassem providências e compelido a ceder à tentativa do que classificou de extorsão. Disse ainda que estava assustado, intimidado, amedrontado, e que quando pensou em ceder, sua esposa, que sabia do caso, e até aquele momento seria a única, o convenceu a procurar a Polícia Federal.
Que como a pessoa que o procurou se identificou como promotor de Justiça, não se sentiu seguro em procurar a corregedoria do MP-PI ou Polícia Civil, por medo de que de alguma forma o promotor de Justiça viesse a tomar conhecimento e as ameaças piorassem.
Após as investigações, o promotor de Justiça Maurício Verdejo foi afastado das funções por um ano pela Justiça, que também determinou entre outros, o uso de monitoramento eletrônico.
Rápido bate e volta
A solicitação de pedido de cooperação enviado pela Subprocuradoria-Geral de Justiça Jurídica à Polícia Federal, após esses relatos chegarem ao Ministério Público Estadual, ocorreu em 1º de agosto.
A operação inicial seria realizada em cerca de 12 dias a contar da abordagem do promotor de Justiça em Barra Grande.
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