Relação Suspeita -

Advogado praticamente implorava para Arimatéia Azevedo lhe dar dinheiro, indica inquérito da Civil

 

Por Rômulo Rocha - Do Blog Bastidores

 

 

ESSA FONTE...

Uma fonte repassar um texto, sugerir uma pauta, uma manchete, dizer como ficaria melhor, ou checar junto com jornalistas os dados ou repassar mais informações não é anormal, ou repassar seguidas informações também não é anormal. Policiais, por exemplo, escrevem textos sobre prisões e apreensões ocorridas no interior do estado e enviam para jornalistas. Muitas vezes, alguns jornalistas, sequer checam, mas publicam. Acreditam na fonte, a acham crível (se a notícia não se mostra verdadeira, o vínculo se rompe). Assim também faz o governo com suas assessorias, tentando obter espaço nos meios de comunicação. Se é “fogo amigo”, jornalistas não ligam para isso. Não importa se a informação vem de dentro de um governo, de fora dele, de um popular, de um padre, um santo, um criminoso (sobre tortura e abuso, por exemplo) de um preso (Lula era fonte). Profissionais de imprensa querem saber se o que lhe é levado é verdadeiro, suscita discussões, informa a sociedade, possui interesse público, ou, se traz à tona fatos não revelados - pelo menos, assim deveria ser.

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_Delegado-Geral de Polícia, Lucy Keiko, para onde foi dirigida a representação de empresário
_Delegado-Geral de Polícia, Lucy Keiko, para onde foi dirigida a representação de empresário contra jornalista e advogado (Foto: 180graus.com)

… NÃO É FONTE

A relação, no entanto, entre jornalista e fonte, passa a merecer uma certa atenção quando os diálogos envolvem tratativas sobre repasses de dinheiro. 

Baseado nisso, a Polícia Civil do Piauí entendeu que a relação entre o jornalista Arimateia Azevedo e sua suposta fonte, o advogado Rony Samuel de Negreiros Nunes (SAMUCA), seria um tanto promíscua, não se tratava de relação fonte/jornalista necessariamente.

O advogado, ouvidor-geral do município de São Raimundo Nonato, chegou praticamente a implorar por dinheiro para o dono do Portal AZ.

Isso aconteceu em 2019, segundo informações de posse da polícia estadual, baseadas no que foi extraído do celular do profissional de imprensa quando da operação realizada em meados de 2020.

PEDIDOS DE DINHEIRO EM PERÍODO NATALINO E VÉSPERA DE ANO NOVO

“Amigo, veja se me arruma qualquer coisa amanhã”,  “Estou c um problema sério para resolver e sem nenhum tostão”, são algumas das mensagens repassadas por Rony Samuel para o WhatsApp de Azevedo, segundo a autoridade policial. 

Era 23 de dezembro de 2019, véspera de Natal, houve novas mensagens do advogado para o jornalista. “Boa tarde”, “Amigo, veja qq coisa pra mim”. No que responde Arimatéia Azevedo: “Tá meio difícil… ver até amanhã o que entra”. O advogado praticamente implora: “coloque aí pelo menos 300 para seu amigo”. Era 30 de dezembro de 2019. 

Em 13 de março de 2020, um sábado, Rony Samuel questionou o jornalista “Como está nosso financeiro?”. Arimatéia Azevedo responde: “ruim”. “Esperar quarta”, continua. 

“R$ 150 MIL”

Antes da polícia usar esses diálogos para caracterizar a relação de proximidade entre Arimatéia Azevedo e Samuca, que até então era um alguém que mandava informações e notas para o jornalista, é possível verificar outros diálogos no inquérito, a exemplo de um datado de 21 de março de 2019.

“Arimateia e Rony trataram sobre o pagamento da quantia de R$ 150 mil para uma pessoa de nome André, e discutiram se o valor também seria [para] os investigados ou se os valores pagos já incluíam os investigados”, informa a introdução policial.

“O Edson Ferreira deu 150 mil pro André. Procura saber se vai dar pra nós”, orienta Ari. “Será se não colocou junto?”, indaga o Samuca. “Pqp”, complementa o jovem. “Vou atrás”, continua. “Achei muito só para ele”, avalia Azevedo. 

Arimateia também chegou a encaminhar dados bancários para o “Samuca”.

A Polícia diz que não identificou quem realmente seriam Edson Ferreira e André. Fonte do Blog Bastidores, do 180graus.com, sugeriu nomes que orbitariam na região de São Raimundo Nonato.

A CEREJA DO BOLO PARA A POLÍCIA

Antes de trazer tudo isso ao procedimento investigativo, a Polícia apenas havia instaurado, em 14 de julho último, um inquérito para investigar o caso, de número 6314/2021. 

E antes, dia 13 de julho, Lucy Keiko Leal Paraíba, o delegado-geral de Polícia Civil do Estado do Piauí, diante de representação criminal do empresário Thiago Gomes Duarte, dono da empresa de medicamentos Saúde e Vida, designou em caráter especial o delegado Titular da Delegacia de Repressão aos Crimes de Informática - DRCI, para que instaurasse o competente procedimento policial investigativo, objetivado, claro, a apuração criminal dos fatos. 

A Polícia já estava de posse então da mensagem (abaixo) encaminhada por Rony Samuel, onde havia trecho de nota da coluna do jornalista Arimatéia Azevedo para o WhatsApp de Lamarque [D Lavor Santana de Almeida Rocha], parceiro comercial do empresário supostamente alvo de tentativa de extorsão. 

Diz a mensagem: “Se ele não terminar de pagar o Rafaelvai ser uma nota por dia até sexta-feira”. “Pelo menos atenção da polícia eu tenho certeza que chama”. Segundo a representação endereçada à delegacia-geral, “ele” seria o “noticiante”, ou seja, o empresário Thiago Gomes Duarte, sobre quem seu parceiro comercial disse que R$ 15 mil "ele" gastava era com ração de cavalo por dia.

Por que então uma suposta fonte, que tem acesso livre a um jornalista para divulgar informações, pede dinheiro a ele, trata de dados bancários, e usa então a nota desse mesmo jornalista para cobrar de um terceiro valor monetário, com tons de ameaça?

Esse roteiro vai sendo seguido pela Polícia que tenta caracterizar o crime de extorsão.

As notas usadas por Rony para obter vantagem econômica, publicadas em coluna jornalística, seriam as seguintes, datadas de 29 de maio de 2021:

Em face dessas notas, as conclusões da representação do empresário que se sentiu extorquido, endereçadas à delegacia-geral, foram as seguintes:

“Pelo contexto da ameaça, fica claro que Rony Samuel tinha acesso livre e direto ao Porta AZ, e que o site, mantido e alimentado pelo jornalista Arimatéia Azevedo, atua como parceiro nas ameaças. Na prática, Arimatéia e Rony estavam chantageando e extorquindo o Noticiante para que este, mediante pagamento em dinheiro, evitasse a publicação de notas supostamente incriminadoras. 

Observe-se que, na troca de mensagens, Rony Samuel potencializa sua extorsão ao afirmar que “pelo menos atenção da polícia eu tenho certeza que chama”, dando a entender tanto que 1) em caso de não pagamento da extorsão, haveria uma série de mensagens plantadas com o objetivo de deflagrar investigações contra o Noticiante; 2) essas notas seriam arquivadas ou ignoradas mediante pagamento em dinheiro. Em outras palavras: a publicação de notas negativas sobre o Noticiante estava condicionada ao pagamento de dinheiro aos responsáveis pela extorsão. 

Rony deixa claro que, com a colaboração de Arimateia Azevedo, pretendia obrigar o Noticiante a tomar um determinado comportamento (no caso, o pagamento em dinheiro), por meio de ameaça de publicação de uma série de notas em jornal, com a intenção de obter vantagem econômica.

A participação de Arimateia Azevedo, no caso, está comprovada pela mensagem encaminhada pelo próprio Rony, que denota ter sido a nota “Alô, Florentino”, plantada com a finalidade específica de coagir o Noticiante a desembolsar  valores em dinheiro com o objetivo de suspender as publicações desabonadoras na coluna de Arimateia”

Para o “Noticiante”, trata-se de Crime de Extorsão praticado por duas pessoas, o que atrai o tipo previsto no § 1º do Artigo 158 do Código Penal.

“Ressalte-se, no caso, não se tratar de conduta protegida pela liberdade de imprensa, tendo em vista a caracterização de notas propositalmente plantadas claro objetivo de coagir o Noticiante e, desta forma, obter vantagem econômica”, conclui o documento assinado pelo empresário Tiago Gomes Duarte, endereçado ao delegado-geral de Polícia.

ARIMATEIA AZEVEDO SABIA DO PEDIDO DE VALOR MONETÁRIO?

Um relatório de investigação aponta que “os diálogos armazenados [entre jornalista e advogado] têm início em novembro de 2017 e se encerram em junho de 2020, data de apreensão do aparelho celular do qual foram extraídos os diálogos e prisão do investigado Arimatéia Azevedo”.

O mesmo relatório informa que “dos diálogos foi possível inferir que os investigados atuaram constantemente com a publicação de matérias jornalísticas de teor político, e que parte das matérias veiculadas no Portal AZ sob autoria de Arimatéia Azevedo foram/eram produzidas por Rony”. 

Ainda que, “conforme item anterior, foi possível identificar diversas passagens em que o investigado Rony solicitou dinheiro para Arimatéia, porém não foi possível identificar a razão das solicitações”. 

O caso, no entanto, requer necessários outros questionamentos: se no tocante ao empresário da Saúde é Vida, Arimateia Azevedo sabia do pedido e das ameaças feitas pela sua suspeita fonte, além de que quem são as pessoas de Edson Ferreira e André? São nomes realmente que orbitam São Raimundo Nonato? 

A resposta para a penúltima pergunta do relatório policial dita: “Não foi possível identificar o motivo do citado pagamento ou qualificar as pessoas de Edson Ferreira e André, sendo necessárias outras diligências”.

Além do mais, mais questionamentos: por que a suposta fonte do Portal AZ supostamente exigiu dinheiro do “Noticiante” [empresário supostamente alvo de extorsão] para um outro empresário, de nome "Rafael"? E por que o “Noticiante” teria que pagar R$ 15 mil a “Rafael”? Qual a ligação de Samuel com Rafael?

Rony Samuel, sabe a polícia, é ex-assessor parlamentar do ex-deputado federal Paes Landim.

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CASO DELICADO

Por RR

A situação é um tanto delicada, porque uma fonte de um jornalista mais descuidado pode a qualquer momento lhe repassar informações costumeiramente e usá-las em sua região, por exemplo, para cobrar valores, sem que o profissional saiba. Em face disso, haver, obviamente, uma representação junto à autoridade policial e ela indiciar fonte e jornalista por eventual extorsão. 

A questão, porém, no caso do jornalista Arimateia Azevedo, são os mais recentes acontecimentos pretéritos, principalmente, os advindos de 2020 para os tempos atuais, quando botaram em seu pescoço o chocalho que acharam lhe cabia, baseado, segundo investigações de agentes de Estado, em supostas provas, que o jornalista nega veementemente existirem. De todo modo ele vive, atualmente, em um contexto.

As páginas do inquérito que chegaram ao conhecimento do Blog Bastidores, do 180graus.com, não necessariamente evidenciam que Arimateia Azevedo sabia do pedido de valores para terceiro, mas evidencia uma relação com tratativas de valores entre jornalista e a 'fonte', sem que seja especificado a razão da sua existência, já que a 'fonte' não seria jornalista do Portal AZ. 

O artigo que tipifica o crime de extorsão no Código Penal dita que nele incide quem “Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça ou deixar de fazer alguma coisa”.

Soou estranho então à polícia que a coluna do jornalista tenha sido usada para cobrança de dinheiro havendo um histórico de suposta proximidade com tratativas de dinheiro anterior ao caso recente. Foi um prato cheio para a nova investida contra o profissional de imprensa.

De toda sorte, uma coisa é certa (sem qualquer julgamento prévio condenatório ou absolutório sobre a conduta do jornalista, papel da justiça em todas as suas instâncias): essa 'fonte' não é fonte, essa 'fonte' não é fonte que se preze, essa 'fonte' não é boa.

E há muitos que já se perguntam: como alguém tão inteligente não percebeu isso?

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