Sinal de concordância -

Artigo do Mário Rosa: 'Ei, por Santo Expedito, eu quero ser levado a sério!'

Eu quero ser levado a sério. Sério! Eu quero chegar a um restaurante e falar uma tolice e ver a contração vertical do esternocleidomastoideo fazendo as cabeças à minha frente embasbacadas flexionarem de cima para baixo e de baixo para cima em sinal de concordância.

E eu quero me acostumar tanto com isso que com o tempo vou vomitar tolices cada vez mais absurdas e nem vou reparar o bale de crânios aquiescestes ao meu redor.

Eu quero ser levado a sério para ter uma expressão grave no rosto toda vez que sair de casa ou, pelo menos, quando for postar no meu site. Daí estarei atormentado com tudo que está acontecendo. Falarei o quanto é sério o que está em jogo.

Desligada a câmera, comentarei com minha amada o que ela achou. E ela, apaixonada pela minha seriedade, irá dizer que nunca viu alguém tão sério como eu. E que se apaixonou por mim justamente porque sou sério. E eu, por alguns instantes, ficarei emocionado. E farei um amor tórrido. Ah, seriedade, o que seria de mim sem você?

Minha seriedade me faria algo muito valioso. Mas eu jamais me venderia, pois seríssimo seria. Admitiria, no máximo, com o mais rígido rigor, permitir que alguns –alguns poucos– pudessem estar associados a mim. Não a mim: à minha seriedade.

E como minha seriedade seria algo escasso e extremamente nobre, teriam de retribuir esse meu generosíssimo gesto de extrema preferência com uma contrapartida astronomicamente proporcional. Afinal, só compartilharia em público minha seriedade com poucos e esses poucos deveriam se sentir gratos pelo meu gesto de escolhê-los.

E ao fazê-lo estaria blindando minha seriedade de andar com más companhias e estaria dizendo ao mundo que esses, esses com quem eu ando, esses poucos escolhidos, seriam sérios. Quanto valeria isso?

Mas eu nem cobraria a mais por essa intangível transferência de seriedade. Eu iria querer voar em executivas, frequentar hotéis cinco estrelas na Europa e nas grandes capitais do planeta, iria querer ser habitué dos grandes restaurantes, falar dos vinhos caros com desdém, iria querer diante daqueles crânios pavlovianos que abanam os seus escalpos diante de mim demonstrar que era sério e que dinheiro para mim não era mais importante.

E que enquanto os antiéticos corriam atrás de dinheiro, para mim isso nunca me faltou e que sempre desprezei essas coisas. O dinheiro é que corria atrás de mim. Mas, para mim, tanto fazia.

Minha amada, então, me olharia apaixonada, mais do que nunca, com os olhos marejados, talvez efeito do Petrus que estaríamos degustando. E eu com minha expressão mais séria, diante de minha trupe de amigos de Presépio, iria estender a minha mão em direção à dela. E iria enlaçar seus dedos, e meu indicador roçaria o anel de brilhantes que acabara de lhe dar em nossa última estada em Paris. E eu a encararia com minha olheira profunda e minha íris cintilante. E ela me olharia no fundo da alma. E enxergaria o quanto sou sério.

Texto reproduzido do site Poder360

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