Para restaurar confiança -

Joaquim Levy aprende a fazer política para salvar Dilma

O ministro da Fazenda do Brasil, Joaquim Levy, estudou Economia na lendária Universidade de Chicago.

Ele poderá precisar aprender mais algumas lições dos igualmente famosos políticos linha dura da cidade para cumprir sua última missão: salvar o mandato de Dilma Rousseff.

Para restaurar a confiança em uma economia que caminha para a recessão mais profunda em 25 anos, o doutorado de Levy em Economia e sua experiência em gestão de ativos no segundo maior banco do Brasil não serão suficientes.

Ele precisa convencer os parlamentares a aprovarem seu pacote de aumentos de impostos e cortes de benefícios sociais em um momento em que a popularidade da presidente está em uma mínima recorde.

O escândalo de corrupção na Petrobras, que segundo os investigadores da Operação Lava Jato envolveu mais de 50 políticos, torna mais difícil realinhar uma base aliada rachada, em um momento em que a empresa tenta virar a página por meio da divulgação, após um longo atraso, de um relatório financeiro auditado.

“Eu tenho uma grande desvantagem”, disse Levy, 54, no evento Bloomberg Americas Monetary Summit, em Nova York no dia 20 de abril, fazendo referência ao fato de que no Reino Unido o ministro da Fazenda também é um legislador, diferentemente dele. “Eu não tenho esse treinamento”.

O economista está trabalhando para superar essa desvantagem aprendendo a fazer o trabalho de intermediário do poder, com a esperança de conquistar, entre políticos e público, o mesmo apoio que começou a ganhar dos investidores.

Ele se reuniu para um café da manhã com o presidente da Câmara dos Deputados e jantou com parlamentares aliados, usou chapéu de palha em uma feira agrícola e até abriu mão da gravata no palco.

Gafes de Levy

Com a dificuldade de Levy para aprender a linguagem da política, a imprensa se aproveita de suas várias gafes, escancarando-as nas primeiras páginas dos maiores jornais do país.

O grau de sucesso de Levy na conquista de apoio do Congresso ajudará a determinar se o Brasil evitará um rebaixamento da dívida para o status de junk (grau especulativo) e abrirá caminho para o retorno do capital estrangeiro.

Poderá também ajudar a diminuir a inflação e a melhorar a perspectiva de crescimento, salvando a popularidade de Dilma e diminuindo os pedidos de impeachment contra ela.

A publicação dos resultados auditados da Petrobras, na quarta-feira, após um atraso de cinco meses que tirou a empresa dos mercados de bonds, ajudará Levy em seu esforço de reconstrução da credibilidade do país, disse Jankiel Santos, economista-chefe do BESI Brasil em São Paulo.

Os bonds da Petrobras da emissão de US$ 2,5 bilhões para 2024 subiram 1,37 centavo na quinta-feira, para 99,88 centavos de dólar, deixando-os em alta de 6,5 por cento neste mês, segundo dados compilados pela Bloomberg. No mesmo dia, as ações da empresa chegaram a cair 9,4 por cento no início das negociações em São Paulo, mas depois ganharam força e fecharam em baixa de 1,5 por cento, a R$ 12,92.

Medida certa

“Eles fizeram uma escolha entre empurrar as coisas para debaixo do tapete e abrir o jogo”, disse Santos, em referência aos resultados que mostram um prejuízo líquido de R$ 21,6 bilhões (US$ 7,3 bilhões) para 2014, dos quais R$ 6,2 bilhões foram relacionados à corrupção.

“Eles escolheram a transparência e isso ajuda a restaurar a confiança do investidor. Isso elimina completamente as preocupações? Não, mas é um passo na direção certa”.

Após atingir a maior baixa em 12 anos no dia 19 de março, o real recuperou 11 por cento e teve o melhor desempenho entre as 16 principais moedas monitoradas pela Bloomberg.

O Ibovespa subiu 11,4 por cento desde que Levy assumiu, no dia 1º de janeiro, após chefiar a divisão de gestão de ativos do Bradesco. Contudo, no ano passado o real registrou o pior desempenho entre as principais moedas.

“Os mercados querem comprar Brasil, querem ser parte do Brasil”, disse Jorge Mariscal, CEO para mercados emergentes do UBS Wealth Management, por telefone. “O México parece menos atraente agora e o Brasil poderá ser mais interessante se o sr. Levy conseguir algum progresso na fronteira fiscal”.

Depois da meia-noite

O envolvimento de Levy com a política é incomum para um ministro da Fazenda brasileiro, que tradicionalmente confia ao ministro-chefe da Casa Civil e a outros assessores da Presidência a tarefa de lidar com os 28 partidos políticos com representação no Congresso e suas idiossincrasias.

No começo, quando enfrentou uma oposição a suas propostas, Levy teve que fazer a lição de casa. Ele se informou a respeito de como eram formadas as comissões bicamerais e como eram escolhidos os relatores dos projetos de lei, segundo um parlamentar que participou de uma reunião na qual Levy fez a pergunta.

O parlamentar pediu para não ser identificado porque se tratou de uma reunião privada.

Levy, que frequentemente trabalha 14 a 16 horas por dia e fica até bem depois da meia-noite em seu escritório no quinto andar do Ministério da Fazenda, em Brasília, teve que se retratar pelo menos duas vezes após cometer gafes e criticar a presidente Dilma.

Em um evento fechado com estudantes da Universidade de Chicago, em São Paulo, no mês passado, Levy disse que Dilma às vezes não aplicava políticas da “maneira mais efetiva”. Depois que o áudio vazou, Dilma disse que os comentários de Levy haviam sido mal interpretados.

Capitão da equipe

“Levy começou como centroavante da equipe de Dilma e agora é o capitão”, disse Gabriel Petrus, analista político da Barral M Jorge, uma firma de consultoria. “Em alguns aspectos ele é mais importante do que ela”.

Para se misturar com os fazendeiros em uma feira agrícola, neste mês, Levy usou um chapéu de palha.

O toque folclórico não o impediu de anunciar notícias ruins: ele disse que as taxas de juros para empréstimos agrícolas seriam elevadas.

O esforço de Levy para aplicar alguma habilidade política no estilo de Chicago e fortalecer suas relações com os parlamentares ganhou impulso quando Dilma convocou o vice-presidente da República, Michel Temer, para fazer a ligação com o Congresso, no início deste mês.

Temer dá a Levy um “aliado de peso”, disse Eunício Oliveira, líder do Partido do Movimento Democrático Brasileiro, ou PMDB, no Senado. Temer, que também é do PMDB, ajudará a melhorar as relações com seu partido, que tem se oposto a algumas propostas do governo, apesar de ser o principal parceiro da base aliada de Dilma.

Conselho político

O senador Romero Jucá, também do PMDB, disse que aconselhou Levy a reembalar suas medidas pouco populares com planos para estimular os investimentos e simplificar os impostos. Isso tornaria mais fácil a obtenção de apoio parlamentar aos ajustes, segundo ele.

“O governo precisa de um plano econômico de crescimento e não apenas de cortes de orçamento”, disse Jucá em entrevista.

Levy terá que estar preparado para fazer algumas concessões e abrir mão de algumas economias para aprovar seu pacote de austeridade, disse o senador José Agripino, vice-líder do DEM, um partido de oposição.

Os parlamentares já realizaram mudanças no pacote original de cortes nos benefícios e aumentos de impostos de Levy que reduziriam seu tamanho inicial de R$ 23 bilhões neste ano.

Isso poderia comprometer seu objetivo de alcançar um superávit primário, ou seja, antes do pagamento de juros, equivalente a 1,2 por cento do produto interno bruto. No ano passado, o governo registrou déficit de 0,6 por cento do PIB.

‘Novo caminho’

O cumprimento da meta “exigirá que as medidas que enviamos ao Congresso sejam aprovadas e exigirá muita atenção”, disse Levy na cúpula monetária.

Ele continua otimista quanto às perspectivas: “As pessoas entendem que isso é essencial para colocar o Brasil em um novo caminho de crescimento”.

Nos EUA, Chicago se tornou sinônimo de políticos que usam um misto de dureza, pragmatismo e clientelismo para atingir seus objetivos.

Embora esse estilo possa não ser natural em Levy, ter uma reputação de economista de linguagem clara e sem afiliação pode ter vantagens entre alguns políticos.

“Ele é a única pessoa em quem confiamos”, disse Paulo Pereira da Silva, deputado federal de oposição do partido Solidariedade. “Levy nos fornece dados técnicos e tenta cumprir seu papel político”.

Fonte: Com informações do Exame.com

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